Grupo mescla sonoridades urbanas ao xote e baião e se apresenta em tradicional espaço cultural, sinalizando a renovação do gênero para novas plateias.
Um cartaz minimalista, de tom verde-água, anuncia: “Forró na Caixa”, nesta sexta-feira (31), às 21h, na Vila do Porto. O que poderia ser apenas mais uma noite trivial de dança de salão é, na verdade, um sintoma da transformação mais vibrante pela qual o forró vem passando na última década.
Longe do imaginário estereotipado das festas juninas ou das grandes casas de forró universitário, o que vemos é um movimento de reinterpretação do gênero, e o “Forró na Caixa” é um exemplar curioso desse fenômeno.
Analisamos quatro curiosidades que esse simples cartaz revela sobre a cena musical contemporânea.
1. A Curiosidade do Nome: “Na Caixa”
O nome do grupo é, em si, uma provocação. O termo “caixa” é ambíguo. Pode remeter ao instrumento de percussão, essencial no ritmo, mas também sugere algo contido, formatado, “enlatado”. No entanto, a proposta do grupo parece ser o exato oposto: um forró “fora da caixa”. Eles operam em um formato mais enxuto, direto, quase acústico, adaptado não para grandes festivais, mas para o calor dos pequenos palcos, onde a troca com o público é imediata. É o forró em sua essência rítmica, mas embalado para novos ouvidos.
2. A Estética: O Fim do Estereótipo
Basta uma rápida olhada na foto de divulgação do grupo para notar a dissonância imediata com o imaginário tradicional do forró. Não há chapéus de couro, vestidos de chita ou sandálias de sola. Em seu lugar, vemos uma estética que bebe direto da fonte indie e da MPB contemporânea: cabelos com afro volumoso, tatuagens, sobreposições de jeans e malhas.
Essa imagem não é acidental. Ela comunica diretamente com um público mais jovem e urbano, que talvez nunca tenha se identificado com a iconografia clássica do sertão, mas que se vê atraído pelo balanço contagiante do xote e do baião.
3. A Fusão Sonora (Implícita)
A estética visual quase sempre antecipa a fusão sonora. Grupos dessa nova safra, como o Forró na Caixa, ousam mexer no sagrado triângulo de Gonzaga (sanfona, zabumba e triângulo). Embora a base rítmica permaneça, é comum que a sanfona seja substituída ou complementada por um teclado “vintage”, uma guitarra com reverb ou linhas de baixo mais complexas, que flertam com o jazz e o samba-rock. O resultado é um som que mantém a cadência para a dança, mas o tempera com harmonias e timbres mais familiares ao pop alternativo.
4. O Local: A Vila do Porto como Selo
A escolha da Vila do Porto como palco não é um detalhe menor. Historicamente, a Vila é um espaço conhecido por abrigar a vanguarda, o experimentalismo e o cenário independente, sendo um ponto de encontro para o rock alternativo, o jazz e a música eletrônica.
Ao abrir suas portas para um evento de forró — mesmo um de roupagem nova —, o local envia duas mensagens. Primeiro, legitima essa nova vertente do gênero, dando-lhe um “selo de aprovação” cultural. Segundo, sinaliza que o próprio forró rompeu suas barreiras. Ele deixou de ser um ritmo de nicho ou sazonal e passou a integrar o circuito cultural cool da cidade, disputando espaço (e público) de igual para igual com outros gêneros.
O show desta sexta (31) é, portanto, mais do que um simples convite à dança. É uma oportunidade de testemunhar a história sendo escrita: a tradição nordestina provando sua resiliência, não como peça de museu, mas como música viva, pulsante e em constante (e bem-vinda) evolução.